Após alguns meses de organização, conversas, listas, orçamentos, itinerários, bobagens, promiscuidades pelo MSN, e uma série de outras coisas, decidimos que faríamos uma viagem por nossa região à busca de novas formas de lazer. Algo que fosse divertido e ao mesmo tempo mesclasse baixo custo e valorização das riquezas locais.
Semana passada, publicamos o relato da primeira parte desta aventura: uma visita ao Parque Estadual Sete Passagem, em Miguel Calmon/BA. Neste parque existem nascentes dos rios Paraguaçu e Itapicuru, formando 14 lindas cachoeiras em área serrana e de vegetação extremamente diversificada. Sua fauna e flora possuem inúmeros exemplares endêmicos e em extinção. Vale à pena conferir, não só pela sua importância ecológica, mas, sobretudo pela sua beleza paisagística.
Na segunda etapa, visitamos a Toca dos Ossos e o Poço Verde, ambos em Ourolândia. A Toca dos Ossos é uma caverna com padrão labiríntico espongiforme, com possíveis 15 quilômetros de extensão, um dos sítios mais fossilíferos do Brasil, onde foram encontrados inúmeros fósseis de mega-mamíferos pleistocênicos. O Poço Verde é um afloramento do lençol freático, possivelmente uma dolina, típica de relevo cárstico (traduzindo: o teto/solo caiu porque a água dissolveu o calcário). A cor esverdeada/azulada deve-se ao cálcio e magnésio dissolvidos na água.
O “Clube do Bolinha” sofreu algumas substituições, ficando com a seguinte escalação:
- Edson D’Angelo (Edinho ou Idiosmar)
- Egnard Júnior (Vicente ou Chicó)
- Ericson (Erick ou Big-Foot)
- Huelber Figueredo (Gudão, Água Mineral ou Cremosinho)
- Joziel (Joca-Tigre)
- Marcelo Carneiro (Pankas, Boer, ou Tony Ramos)
E no segundo dia somaram-se:
- Nilson Bonfim (Negão, O Salvador)
- Lucas D’Angelo (Cabeção)
- Marcelo Magno (Filhote ou Felê)
Novamente nos atrasamos devido a alguns novos probleminhas com a InVenenada. E desta vez não teríamos Negão, O Salvador, para nos socorrer na distribuição de peso ou nos “cavalos” a mais de potência.
Logo que saímos de Várzea Nova, percebemos que algum instrumento estava arando a terra num período não muito propício ao plantio. O escapamento insistira em acariciar o chão, e não tivemos outra opção senão bater perna cerca de 500 metros em busca de um pedaço de araminho que fosse para amarrar o tal escapamento. Felizmente o amigo Joca-Tigre leva jeito em recolher um arame ou outro de uma cerca alheia. Além do mais, um inusitado habitante dos sertões queria nos ajudar: um jumento. Depois de amarrado o teimoso (o escapamento, não o jumento), seguimos viagem, só parando numa rocinha para pegar umas espigas de milho emprestadas... (Pretendemos pagá-las na próxima viagem, hehehe).
Imponentemente, seguimos viagem em direção a Ourolândia. Pensávamos que só pararíamos em nosso destino. Pensávamos...
Passamos pelo Povoado de Tabua, comunidade que possui uma extensa área de água, sendo praticamente cortado pelo Rio Vereda da Tabua, apresentando em suas margens plantações de hortaliças, além de utilizar essa água como forma de subsistência. Como já esperado e sabido, o Povoado de Tabua possui potencialidades ainda não exploradas por seus habitantes, tanto na agricultura, quanto na pecuária e na piscicultura, fontes de renda estas já exploradas por nossos ilustres vizinhos.
Na saída da Tabua, nos deparamos com um novo, porém pequeno problema com a InVenenada. De repente, curtindo um som (dos celulares, não da InVenenada, é claro), ouvimos um ruído estranho que partia de nosso magnífico veículo. Paramos, descemos, olhamos, todos ao chão. O que encontramos?... Nada! Decidimos então fazer uma série de testes. Primeiro apenas empurramos o carro para frente (muito comum nesta viagem, diga-se de passagem), mas o ruído continuava. Decidimos testar os freios... Nada! Verificamos a embreagem... Nada também! Tentamos com a caixa de marcha... Mais uma vez... Nada! O que fazer?!? Ó dúvida cruel. De repente, um Insight. Por que não empurrar para trás? Foi o que fizemos. Para nossa surpresa e total alegria (e preocupação), depois de um forte barulho, que foi seguido de um estrondo nada agradável, foi ao chão o causador de nossos problemas... “A Peça”.
O carro havia se regenerado, voltara a ser o que era antes, estava novo... (acho que exageramos...). Enfim, o ruído havia sumido, nossos problemas estavam resolvidos. Mas uma dúvida nos perturbava a mente: de onde havia surgido “A Peça”? Procuramos, procuramos, e depois de longos e intermináveis 3 minutos, decidimos que não procuraríamos mais. Se a InVenenada estava andando, tudo estava “azul”. Não “contamos” conversa, colocamos “A Peça” no bolso e, de forma viril, seguimos viagem.
Chegamos a Ourolândia com estilo: óculos escuros, braço pra fora do carro (na verdade, pra porta não abrir) e uma bagagem em cima do possante nada discreta, que nos fazia parecer vendedores ambulantes, daqueles que saem de porta em porta oferecendo alguma bugiganga. Até poderíamos ter passado despercebidos, não fosse o fato de que em todo quebra-mola, a InVenenada transformava-se numa gangorra.
Doidos pra chegar ao nosso destino subterrâneo, pedimos informação (num posto de gasolina, pra variar) e seguimos adiante. Por uma leve distração, passamos do ponto, tendo que pegar informação com a quase inexistente população naquela árida caatinga. Felizmente, encontramos um cambaleante ciclista, que por sua voz carregada e traje maltrapilho, fez-nos suspeitar da sua sobriedade.
- A toca? Que sabê mermo? Vá, vá... Chegano nas peda, pode entrá qué lá!
Depois de receber valiosa e precisa informação, seguimos olhando pelo retrovisor do qual avistamos o ébrio rapaz se espatifar no chão, que, indiferente às altas temperaturas daquele rubro solo, caiu em sono profundo...
Depois de uma pequena discussão sobre nosso cardápio, almoçamos à beira da Toca dos Ossos: pão, mortadela e coca-cola quente – por pouco não houve disputa ‘no braço’ pelo nutritivo alimento. Bem alimentados e prontos para uma nova aventura, seguimos toca adentro.
Felizmente, entrar na toca é tão assustador quanto empolgante, sobretudo por saber que ali está um dos sítios paleontológicos mais importantes do Brasil, onde foram encontrados inúmeros fósseis de mega-mamíferos extintos do pleistoceno (“Era do Gelo”), como por exemplo, preguiças e tatus gigantes. A Toca dos Ossos merece esse nome por ser uma das cavernas mais fossilíferas do país.
Para azar dos visitantes, os transeuntes da estrada ao lado têm a coragem de se agacharem na entrada escura da toca e liberarem seus filhotes fecais... Vencidos tais odores, o mau cheiro seguinte era dos morcegos (das fezes, urina, deles mesmos). Aliado a isso, a temperatura no subsolo era muito elevada, lavando a alguns de nós, menos preparados, a transpirar e ter leve falta de ar.
Satisfeitas a curiosidade e o desejo por altos flashes, depois de perambular subterraneamente por uns 150 metros, saímos rapidamente da toca antes que perturbássemos os donos do pedaço: uma manada de morcegos que torcíamos para não serem hematófagos...
Saindo da Toca dos Ossos e dando adeus aos assustadores quirópteros, passamos em Ourolândia para comprar 33 pães, 600 gramas de mortadela e 6 coca-colas, pechinchando até vencermos a vendedora no cansaço. De lá, seguimos para o Poço Verde, onde acampamos.
Tomamos banho dentro do poço, os seis, quando já estava escuro (não seria nada agradável se fossemos flagrados nessa cena torpe), sob luzes de lanternas, e obviamente (por questões ecológicas), sem usar sabonete. Como ficamos limpos sem sabonete? Ficamos dentro d’água até nos sentirmos como tal, ou com os dedos engelhados.
À tardezinha chegaram Negão, Cabeção e Filhote (“- Peitiiinhooo!”).. Fizemos uma fogueira em volta da qual passamos a noite cantando ao som do violão (e uns jogando xadrez (coisa de intelectual), outros discutindo astronomia, outros contando piadas...). Comemos o cuscuz de Edinho, recheado com exatas 12 rodelas de salsicha pra cada (muita gente gostou tanto que quis repetir). Depois, partilhamos umas espigas de milho assado, que, não sei por que, pareciam bem mais saborosas...
Todos pretendiam acordar com as galinhas, já que no dia seguinte Negão teria que voltar cedo para trabalhar e o Cabeção para estudar (estudar??). No entanto, a todo momento alguém –especialmente o Negão – lembrava de algum causo sem graça ou alguma piada infame pra contar, afugentando nosso sono até a madrugada...
Acordamos com o sol para aproveitarmos ao máximo o Poço Verde, pois corria o risco de ter muitos visitantes, já que era feriado municipal. Independente dessa preocupação, fomos acordados, um a um, por uma perturbadora melodia. O Negão pegou o violão e saiu, de barraca em barraca, tocando uma irritante composição, mudando de tom pra variar a tortura auditiva. Depois do desjejum (pão, mortadela e poupa de fruta desidratada – kissuki), fomos contemplar a beleza cênica do Poço Verde.
Brigávamos para ter a vez nessa ou naquela pedra, nessa ou naquela posição. A beleza cênica do local é surpreendente. Infelizmente, pessoas irresponsáveis deixaram ali muito lixo (embalagens plásticas, pedaços de roupas, copos descartáveis, garrafas quebradas e até preservativos!), mas ainda assim, um gostoso banho foi possível. Apreciamos a água fresca por um bom tempo, mas com certo medo de escorregarmos pro fundo, mesmo todos sabendo nadar como peixes, pois, reza a lenda, nunca fora achado o fundo desse poço...
Chegando o horário limite, Negão e Cabeção tiveram que partir, levando Gudão (que sabe-se lá por quê, amarelou) e deixando Filhote (“- Peitiiinhooo!”). Tiramos mais algumas fotos no Poço Verde e por volta das 10:30h saímos na tentativa de ver um local conhecido como Pingadeira, que esperávamos que não fosse um boteco a conta-gotas...
De imediato, para nossa revolta, descobrimos que a gruta da Pingadeira localiza-se ao lado da Toca dos Ossos, onde estivemos no dia anterior. Caminhamos cerca de 1,5 km da estrada principal até o local, atravessando propriedade particular. Precisaríamos atravessar o rio para ter acesso ao paredão onde se localiza o objeto de nossa curiosidade. Para não correr o risco de todos se lamearem inutilmente, foi escolhido dedocraticamente o geógrafo do grupo para fazer a sondagem. Esse concluiu que não valeria à pena a travessia (sob o risco de se lamear e/ou ser devorado por jacarés do Rio Salitre... “Mentirinha”).
A pingadeira é uma pequena gruta com infiltrações no teto, que justifica seu nome. Dentro da gruta, o nível d’água era de cerca de um metro e, apesar de ter água cristalina e muitos peixinhos coloridos, havia muito lixo disperso, inviabilizando um banho aprazível. Aproveitamos o ensejo para protestarmos contra esses banhistas inconseqüentes e irracionais: lugar de lixo é no lixo!
Saindo da Pingadeira, passamos num local de extração de mármore (Mineração Travertino). Como muitos de nós nunca tínhamos visto uma marmoraria, não deu outra, senão mais uma pausa para inúmeros flashes. Nessa mesma área, vimos muitos sumidouros, outra formação típica de área cárstica. Depois rumamos à Tabua no intuito de, de lá, irmos para a Fazenda Arrecife, importante Sítio Geológico/Paleontológico visitado constantemente por Universidades de todo o Nordeste, como também de várias partes do Brasil (UFOP, UFRN, UFBA, UNEB, UFES, dentre outras), onde almoçaríamos.
Estávamos doidos para chegarmos aos estromatólitos da Fazenda Arrecife, mas, chegando ao centro da Tabua, inventamos de mendigar água pelas casas com garrafas PET de refri na mão. Se não tivéssemos desligado nosso super-motor, certamente teríamos almoçado na nossa ultima e mais importante parada turística.
Por motivos não identificados, a InVenenada não ligava mais. Nem empurrando ladeira abaixo, nem empurrando ladeira acima. Apenas expelia um cheiro forte de propano, butano e metano misturados. (Mas o GLP não só tem butano e propano?? Sim, correto. Nesse caso, o metano era expelido naturalmente de nossos escapamentos pessoais toda vez que fazíamos algum esforço físico demasiado...)
Exaustos de empurrar o possante, arriamos na praça principal da Tabua, naturalmente, chamando a atenção dos residentes. Felizmente, logo apareceram dois prestativos tabuenses que, pra nossa sorte, entendiam de ‘gás’. O problema?? O gás saia do botijão, mas não chegava ao motor. Metade vazava no primeiro registro, a outra metade no segundo... Pra complicar ainda mais, o cabo da vela insistia em escapulir.
Depois de uma hora de pendenga, exaustos de cansaço e de fome, partimos pra brutalidade e puxamos a faca para uma solução aparentemente improvável: havaianas, todo mundo usa! Idiosmar habilitou-se prontamente a ceder seu solado. Metemos a faca no chinelo e resolvemos mais um dilema: vedamos um dos ditos registros. O outro? Resolvemos com uma tira de liga que prendia a bateria ao carro...
Conseguimos (com borracha de sandália, pedaço de borracha de câmera de ar e alguns empurrões) fazer a InVenenada dar fogo. Mas havia um importante detalhe: se o fogo apagasse, teríamos que fazer todo o processo de reconstrução da vedação do registro novamente.
Seguimos adiante, torcendo pra bicha não perder o tesão, digo, o fogo. E tristes por ter abandonado nosso último e mais importante destino por conta das circunstancias adversas.
Lá pras 15:30h avistamos o Estádio Municipal, quando vibramos por mais uma vitória, finalmente estávamos em casa. Já que estávamos com fome, seguimos para casa de Idiosmar onde preparamos mais um maravilhoso almoço (feijoada enlatada, arroz refogado feito por Marcelo e ovo cozido por Erick e Edinho).
Depois de um longo período de espera, quando todos já riam sem saber nem de que ou muito menos o porquê (o que a fome nos faz...), o arroz ficou pronto, sentamos todos à mesa, agradecemos por tão preciosa e deliciosa refeição, e, ao som de muitas conversas e histórias a respeito de nossa incrível viagem, começamos a preparar a próxima viagem que, cá entre nós, provavelmente não superará a primeira, mas certamente ficará registrada também como magnífica.
De maneira geral, essa viagem foi extremamente proveitosa, não só por termos conhecido lugares interessantes – e tão próximos de nós – que há muito pretendíamos conhecer, como também pela construção de novas amizades e fortalecimento das velhas. Deixando em todos os que foram um gosto extremamente adocicado de quero mais, aguardando ansiosamente outra oportunidade de mais uma aventura barata e reconhecidamente valiosa em termos de conhecimento e diversão.
Fica aqui a lição de que para ser turista e se divertir em lugares magníficos e paradisíacos não precisamos ir tão longe e muito menos ter muito dinheiro. Por fim, uma recomendação: não vá de Caravan velha!
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1 comentários:
parabéns ao grupo, se vocês ficarem sem esta caravan ficam sem história
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